domingo, 4 de dezembro de 2011

A GRANDEZA E A IRRACIONALIDADE


   “Só os mortos conhecem o fim da guerra.”
(Platão, s.d.)

Hoje em dia ninguém questiona os benefícios do avanço científico e tecnológico da humanidade. Aqueles que o contestam criticam, evidentemente, a sua própria existência, pois sem o progresso científico-tecnológico esses indivíduos não seriam capazes, provavelmente, de sobreviver ou chegar à terceira idade e permaneciam no estado de primatas das cavernas. Porém, os mais inteligentes e preocupados com a nossa sobrevivência enquanto espécie questionaram a aplicação que o Homem dá às suas invenções.
Os animais irracionais e mesmo criaturas com cérebro desenvolvido ou uma organização social complexa, tal como os golfinhos e as formigas, respectivamente, estão desprovidos de cuidados médicos especializados e tecnologias que permitem governar as forças assustadoras da Natureza submetendo-as às nossas regras e usando-as ao nosso favor. A ausência de conhecimentos científico-técnicos resulta em incapacidade de conquistar um planeta inteiro, mandar satélites para outros corpos do Sistema Solar e para o espaço exterior a este. No entanto, estes animais existem durante mais tempo do que o frágil ser humano - apresentam uma estratégia biologicamente estável.
As descobertas científicas e tecnológicas aparentemente são úteis e benéficas para os seres racionais, mas quando chegam às mãos do Homem, mais ou menos tarde, tornam-se uma arma perigosa. A história da metamorfose de descobertas úteis em poder destrutivo começou com o aparecimento da espécie humana – agressiva e portadora de intelecto. Como sempre, as intenções eram as melhores: descobrir o fogo para se aquecer e cozer os alimentos, mas o resultado é mais drástico – a queima das florestas. A invenção de armas para defesa tornou-se o primeiro passo para guerras sangrentas. Até a invenção da roda, que devia ser posta nas máquinas agrícolas, se transformou em instrumentos de guerra que mataram milhões. Nas mãos do Homem, mesmo hoje em dia, um automóvel ligeiro de passageiros passa a ser a uma arma mortífera responsável por milhares de mortos por ano. “De boas intenções está o Inferno cheio.”
Na Idade Média o conhecimento sobre a anatomia e fisiologia do corpo humano não era usado para curar e salvar vidas, mas para provocar maior sofrimento às vítimas das torturas. No entanto, nada se compara ao auge da mente maléfica do Homo sapiens sapiens, que se iniciou depois da Revolução Industrial, quando o ser humano decidiu acabar não só com os indivíduos mais próximos, mas também com todo o planeta. De facto, a Terra, sendo o ecossistema em que nós vivemos e que garante a nossa existência, passou a ser o principal alvo dos homens. Assim começou a Era da Poluição. Com as novas fábricas e produtos químicos o Homem conseguiu, em duzentos anos, destruir o equilíbrio natural. A acção dos seres humanos está a aproximar-se do efeito de uma “extinção em massa”. Quem serão os dinossauros do terceiro milénio?
Existem várias semelhanças entre os humanos e os dinossauros: eles dominaram o planeta Terra na Era Mesozóica, nós dominamo-lo actualmente. Porém, existe uma diferença colossal - os “répteis terríveis” existiram durante mais de 185 mil milhões de anos e desapareceram na sequência de um desastre natural, os humanos existem como espécie há 2 milhões de anos e já estão à beira da catástrofe planetária. O Homem como espécie tem o record absoluto de espécies extintas. O exemplo mais citado é a extinção da ave dodó pelos marinheiros espanhóis no século XIX. No século XXI, em média, todos os dias desaparece uma espécie da flora ou da fauna nas florestas amazónicas em consequência da acção do homem. Tudo isso provoca um distúrbio ecológico profundo.
Para demonstrar a natureza auto-destrutiva do Homem no seu apogeu temos de nos lembrar do século XX. Uma das mentes mais brilhantes no âmbito da Física da nossa civilização, Albert Einstein, contribuiu, involuntariamente, para a criação da arma nuclear – talvez o mecanismo mais destrutivo do Universo. Por ironia, primeiro surgiu a bomba nuclear e só depois a primeira central termonuclear para fins não militares. Curiosamente, não é a única inovação científica que aparece de uma actividade bélica.
Em suma, a agressividade natural do ser humano, conjugada com inteligência, permitiu-nos sobreviver durante milhares de anos num ambiente hostil, mas ao mesmo tempo constitui o nosso “calcanhar de Aquiles”. A ausência de racionalidade nos seres potencialmente racionais, quando estes são mais perigosos do que qualquer outro animal, resulta numa política de auto-destruição ou destruição mútua, no caso de uma guerra entre duas potências nucleares. Tudo isso exemplifica a “maneira inconsciente como a Humanidade aplica as suas conquistas tecnológicas” (Cousteau, 1978). Somos dotados de inteligência, mas não da razão – ignorantes e cegos num campo de minas criado por nós.

Belerofonte(Pseudónimo)